terça-feira, janeiro 12, 2010

Diários e Transtornos |5|

O Passado


Ás vezes eu acordo atordoado, procurando algum tipo de contato
que quase nunca encontro. Eu descobri que eu não sei estar sozinho, é quase
que uma decepção estar apenas comigo mesmo, como se eu fosse tão pouco.
Costumo chamar pessoas pro meu quarto, qualquer amigo, qualquer pessoa
que eu conheça, apenas para conversar sobre o que quer que seja. O triste apenas é
que, a maioria das pessoas não me dá as respostas que eu preciso, o conforto que eu tanto
quero e nunca tenho.
Se eu pudesse resumir minha vida, como uma sinopse de um filme, eu diria que ela é uma busca.
Mas nem eu mesmo sei o que ando buscando.
Como pode? Ás vezes acho que estou tão perto...Tão perto, perto de quê?
De nada talvez. Ou melhor: De nada com certeza.
Nem eu sei exatamente quando tudo perdeu o sentido, achei que fosse quando começei
com os primeiros erros, os primeiros vícios, mas não.
Antes disso, quando a vida ainda era uma 'perfeição', algo já incomodava como se nada estivesse
certo.
Não tenho muitas lembranças daquela pessoa que fui um dia, apenas lembro de ter sido
uma 'criança brilhante', como todos diziam.
Lembro de nunca ter tido nenhuma dificuldade na escola, lembro de nunca ter levado advertências
para casa, lembro de passar horas lendo e escrevendo, deixando os meus
pais orgulhosos de ter ''um filho inteligente'' lembro que tudo era fácil para mim, mesmo quando
eu fazia milhares de coisas ao mesmo tempo, eu era incansável.
Enquanto os meus pais se preocupavam com a rebeldia do meu irmão, 5 anos mais velho, eu estava
ocupado ganhando prêmios, eu estava ocupado sendo o melhor.
E tudo isso Para quê? Para minha mãe nunca aparecer na escola para me ver recebendo uma medalha,
mas estar sempre lá cada vez que o meu irmão batia em alguém, ou quem sabe para o meu pai nunca
ter olhado meu boletim por que estava ocupado procurando o Dan por onde quer que fosse.
Lembro pouco do Dan, lembro de não gostar dele quando eu era criança, por que eu sempre achava que
todo mundo gostava mais dele.
Só quando eu tinha, por volta dos treze que isso mudou. Viramos amigos, nem lembro o por quê.
Talvez por que ele tivesse parado de me ver como uma criança boba, talvez por que eu tinha crescido e
estava mais parecido com ele.
Lembro que foi nessa época que começei a sair e que começei a conhecer pessoas. Lembro que
eu acordava mais cedo e ia a escola contar a Leslie como tinham sido as festas, ou como o meu irmão Dan
era o dono do mundo. Que vergonhoso! Lembrar que eu era tão bobo assim.
Nesse mesmo ano meus pais se separaram, meu pai foi morar em outro lugar e minha mãe enlouqueceu
por ter dois filhos doentes. Seis meses depois
encontrei um bilhete do Dan que não entendi muito bem:

''A verdade é que eu tenho chorado muito por esses dias,
e sinceramente já não sei o por que disso.
Logo agora que meu coração estava dormente e vazio, isso.
Essa confusão de emoções, essas pessoas, esses acontecimentos.
Talvez, e apenas só talvez, se eu sentar e esperar
o mundo volta pro lugar.
O vazio pode voltar a me proteger...
Não, não, já não quero me render, agora eu quero aguentar.''

E soube por alguns amigos nossos que ele fugiu, foi pegar a estrada com uma banda que nunca ouvi falar.
No ano seguinte, 3 meses depois disso, um pouco depois do meu aniversário
de catorze anos, os pais de Leslie se mudaram para outro estado e eu sabia que não ia mais vê-la.
Eu estava então, sozinho.
Se fosse possível arrancar meu coração e parti-lo
em dois com as mãos, eu diria que tinham feito isso, pois doía como
se ele ja fosse dois pedaços sangrando no chão.
Naquela época até respirar incomodava, até respirar fazia meu coração doer.
Eu não lembro o quanto chorei, só lembro que chorei tudo ali, e nunca mais.
Esses foram os fatos que deram um ponto final nas minhas escolhas e que confirmaram que a
criança brilhante já não existia mais, e o que sobrou foi alguém que procura algo sem saber o que é.